Somente algumas penas restaram onde antes eram magníficas asas de anjo bom, de anjo cuidadoso e satisfeito com seu destino. Fora uma criança feliz e resguardada, mal sabia para onde se encaminharia durante os caminhos tortuosos da vida.
Depois, essa vida lhe pesou nas asas. Tanto, tanto, que as mesmas romperam-se das costas magras de mulher que agora lhe pertenciam. Esperançosas, algumas penas leves e ainda belas se mantinham, relutantes em deixar sua antiga dona sozinha, como jamais achou que seria. Mas ela sabia, sabia tanto quanto as penas que aos poucos eram levadas pelo vento de fim de tarde, sabia que seu destino havia de ser cumprido da melhor maneira que alguém lá em cima planejou. Não sabia se era pai, se era rei ou senhor, sabia apenas que era sábio, que comandava o destino e o tempo, que comandava ela, seu sorriso e seus problemas.
Relaxou aos poucos, em pé na beira da água, sentindo sempre o beijo carinhoso do vento, cada vez mais forte, levar de vez os vestígios das asas que lhe foram arrancadas. O sangue já havia sido estancado, a cicatriz já não latejava tanto assim, dava para conviver, afinal. Dava para viver, afinal.
Enfim… Paz.